domingo, 24 de abril de 2011

Plebe Rude na rua: prato do dia


Clemente e Philippe rachando concreto ao vivo
Foto: Levi Bianco - Futura Press


Plebe Rude
Virada Cultural - São Paulo
Praça Júlio Prestes
Domingo, 17 de abril de 2011

Mais do que rever os brasilienses, a intenção de esticar nossa estada em Sampa depois de compromissos pessoais, foi pra ver de perto a 7ª edição da Virada Cultural da paulistada. Inevitável não comparar com a 1ª edição curitibana fim do ano passado. Muito mais circo que pão pelas ruas de lá: globo da morte, patifaria das lutas livres, performances engraçadinhas com luzes pelo corpo, Zé do Caixão pendurado em um caixão por cabos, bizarrisses de pessoas penduradas por ganchos na pele, etc. Perdemos o Encontro de Bateristas que deve ter sido interessante, mas fomos surpreendidos em uma das esquinas pelo Maracatu e pelas acrobatas no show da Rita Lee. Porém, nem a empolgação gringa dos Misfits e seu público, nem a multidão aglomerada sob o Viaduto do Chá gargalhando com os stand ups foi tão tocante pra mim do que ver Philippe Seabra, André X e Clemente Nascimento no mesmo palco mais uma vez, em praça pública lotada em pleno meio dia de um domingo de sol, fazendo um som de combate com a boa e velha Plebe Rude.

Na praça com a Plebe / Foto: Valdir Antonelli - Drop Music

Ainda a algumas quadras da Praça Júlio Prestes ouço o sampler das gaitas de foles de "O que se faz" (R ao Contrário, 2006) abrindo os trabalhos ao longe: pãrãrãrãrãrã pãrãrãrãrãããã... Confesso que cantar e caminhar a passos largos pela abandonada São Paulo do centro velho na direção da minha banda preferida desde meus 15 anos foi uma experiência que ficará pra sempre na lembrança desse plebeuzinho. Chegando em frente ao palco, vemos uma multidão sob um sol que ainda hoje - uma semana depois - descasca minha testa e careca. O restante do set list de 1 hora foi um desfile vigoroso de pseudohits de uma banda honesta que apesar de ir além do underground nunca chegou ao deslumbre do mainstream - tocar no Chacrinha e clips no Fantástico não contam. Oferecem "A Ida" (Nunca Fomos tão Brasileiros, 1987) pro Kenzo Simabukulu - o japa roadie falecido no começo do ano - e "Medo" (Enquanto a Trégua não vem - Ao Vivo, 2000) a cidade e a banda parceira mais querida: Cólera!

Philippe provocativo como sempre, pede que a gente pergunte com raiva: "Posso vigiar seu carro? Te pedir trocados? Engraxar seus sapatos?" / Foto: Valdir Antonelli - Drop Music

O principal compositor e frontman provoca: "Eu sei que as bandas de Brasília andam decepcionando, mas podem confiar em nós." Emendando "Minha Renda" (O Concreto já Rachou, 1985) vai além ironizando que em São Paulo existe civilização, que por míseros R$ 1.000,00 irão recepcionar os fãs no camarim. Pena mesmo que os restartinos não estavam por lá pra levar esse chacoalhão. Veio "Consumo" e "Nova Era Tecno" (Nunca Fomos tão Brasileiros, 1987) oferecida aos velhos plebeus, onde me encaixo saudosamente. Com 17 anos eu ouvia esse lp o dia inteiro: lado a, lado b, lado a, lado b, lado a, lado b... Também ouvia muito Os Replicantes, Garotos Podres e Inocentes na qual o Clemente foi o fundador, mas os brasilienses sempre foram os xodós. Rolou "Proteção" (O Concreto já Rachou, 1985 e Enquanto a Trégua não vem - Ao Vivo, 2000) com o seguinte comentário de Philippe entre os versos: "Só lembrem o seguinte... Imagine a gente cantando essa música numa praça chamada Julio Prestes com a polícia presente há vinte anos atrás. Que bom galera, que bom!" O tempo passa... Teve também o trecho incidental de "Desordem" dos Titãs: "Quem quer manter a ordem? Quem quer criar desordem?" Um outro pseudohit do movimento punk brasileiro não ficou de fora: "Pátria Amada" com Philippe apresentando o parceiro no final: "Diretamente dos Inocentes, mas também da Plebe, nosso amigo Clemente!"

"Em SP é assim: quem gosta vem, mesmo no almoço!" / Foto: Flavio Moraes - G1

Na boa, eu que tenho tudo deles e acompanho a quase 3 décadas, vou dizer que não me faz falta o Jander Bilaphra. Não que eu não fosse com a cara dele, mas se ele quis transformar a Plebe em uma experimentação desnecessária e cortaram as asinhas dele, ok. Se ele quis morar no mato e virar roadie de algumas bandas nacionais, ok também. Só sei que Clemente o substituiu acima do pedido. Um cara de bem com a vida, que vive de música: discoteca, faz programa web com bandas e toca no Inocentes desde 1981 - fora outros projetos paralelos. Cabra incansável, história irretocável. Boa praça, acessível, entra no sistema, joga areia no mecanismo, sem precisar se vender e se tornar um entertainer como o gargantão do João Gordo. O tempo passa... 6 anos na Plebe tem nome: comprometimento. Philippe sempre foi vigoroso no palco, e, agora em companhia de Clemente é lenha que não acaba mais na fogueira.

A dupla socando a bota / Foto: Flavio Moraes - G1

Philippe conta que vindo de Brasília, uma guria perguntou:
- Vocês são o Victor e Léo?
- Não... Somos a Plebe Rude!
- Plebe o que?
- Uasdhadshu Você não é nosso público alvo.
E emenda ali na praça pra nós: "Vocês são nosso público alvo!"

Não à toa que eles eram a banda preferida do Renato Russo. Tão bom ver nossos ídolos desde a juventude bem, não só corporalmente; lógico. Ativos mentalmente sem cair em modismos e questionando as modas, décadas afora. É tão fácil escrever sobre quem moldou a sua visão da música de protesto em um país de terceiro mundo. Como eles fazem parte da minha história, me
sinto meio dono dela. Philippe mesmo sendo o metido (no bom sentido) que é, continua divertido e ácido questionando quem faz música só pra dançar, esquecendo que as pessoas também podem pensar.

Vida longa a Plebe Rude!